O dia começa. O seu banco te liga para uma simples tarefa: Um esclarecimento de saldo, fácil, não é? Depois você leva seu carro a uma revisão de rotina, e nem se preocupa com nada pois tudo estará resolvido em pouco tempo, certo?
Infelizmente, a experiência do cliente não aconteceu como o esperado: A chamada que para a qual você esperava dedicar 10 minutos se transformou em uma perda completa de 50 minutos adicionais, tudo graças a um labirinto de opções automatizadas do computador, seguido pela frustração de, ao finalmente ser atendido por um ser-humano, você é transferido de volta à máquina por ter “selecionado a opção incorreta”.
Finalmente, você é informado de que a revisão do carro terá um custo 3 vezes maior do que o esperado, porque coincidentemente o mecânico detectou outros problemas, e para fechar com chave de ouro, o seu carro só vai poder ser atendido daqui 15 dias. Que dia, hein?
Não é exagero dizer que estamos praticamente todos os dias submetidos a este tipo de estresse e à essa incômoda sensação de que algo pode dar errado. E esse medo não é infundado, todos nós o experimentamos em algum momento de nossas vidas, e o continuaremos experimentando. A razão disso é muito simples, uma vez que tudo o que foi descrito acima se baseia na ideia de “viver experiências de serviço”. A causa desse sentimento está intrínseca à natureza desses mesmos serviços, que se destacam por sua intangibilidade, sua heterogeneidade, sua simultaneidade e sua caducidade.
Dessa forma, fica claro que experimentar um serviço pode ir desde uma experiência ocasionalmente excelente, boa ou aceitável, passando pela possibilidade de trazer pequenas falhas que acabamos aceitando, até chegar à se tornar na matéria-prima de uma noite de pesadelos.
Dito isso, cabe a pergunta: Porque no outro extremo parece que algumas empresas soam nunca falhar na entrega de seus produtos e serviços, chegando a inclusive proporcionar experiências surpreendentes?
Ao comprar o seu café, a atenção e o tratamento personalizado fizeram a diferença ao começar o seu dia? Você esperava que o seu pacote fosse chegar em 2 semanas, e chegou em 24 horas? Sua loja online favorita te enviou o modelo incorreto do seu novo Kindle (um dispositivo de leitura para livros digitais) e, para te compensar, te enviou o modelo correto de forma gratuita?
Estes casos reais que muitos clientes vivem diariamente são produto da progressiva evolução que experimentou o setor de serviços ao longo das décadas. Em particular, estas experiências proporcionadas por empresas que você já ouviu falar, como a Amazon, Disney, Starbucks, Zappos, entre outras, têm um background que cobrou um maior impulso nos últimos anos, cujo o qual é conhecido como “Gestão da Experiência do Cliente”.
“O serviço ao cliente não deveria ser um departamento, mas sim a companhia inteira” – Tony Hsieh, CEO Zappos
A Experiência do Cliente (do inglês “Customer Experience”, abreviado como CE ou CX) é o produto das percepções de um cliente depois de interagir racional, física, emocional e/ou psicologicamente com qualquer parte de uma organização ou empresa. Essa percepção afeta os comportamentos do cliente e gera memórias que impulsionam a lealdade e afetam o valor económico que gera uma organização.
A experiência do cliente alcança todas as interações desde a sensibilização, atração ou conhecimento inicial de um cliente, assim como o interesse que gerou o marketing, o descobrimento, a compra, o uso, o serviço ao cliente e até mesmo a baixa, sem importar o canal utilizado para isso. Seu alcance é integrador, unindo o negócio em torno da visão do cliente (um serviço deficiente ou fenomenal afetará a percepção de toda a empresa).
Mas… e o que eu vou ganhar implementando uma gestão de experiência do cliente?
Conforme fomos evoluindo até chegar na chamada indústria 4.0 (desenvolvimento de sistemas cibernéticos, internet das coisas, redes etc…), os serviços vêm se transformado também (hoje em dia representam mais de 55% da atividade econômica em países de todos os continentes segundo o Banco Mundial). Dessa forma, se observa que a venda de produtos tangíveis começa a refletir processos de “servitização” como nunca, daí que, por exemplo, a simples venda de um trator começa a incorporar serviços consultivos e de valor agregado ao redor dele mesmo.
Hoje em dia, quem investe na implementação de uma estratégia de gestão de experiência do cliente, está colhendo os frutos em forma de fidelização, recomendação e permanência dos clientes, poderosos “insights” e antecipação das necessidades dos consumidores, ampliação dos seus produtos, diferenciação vs. competência, posicionamento de marca, aumento de rentabilidade da empresa e muito mais.
MKT 4.0 – Adeus economia de serviços e olá economia de experiência.
A gestão da experiência do cliente se apoia fortemente nas estratégias do marketing 4.0, um conceito do professor Philip Kotler, desenvolvido em conjunto de Harmawan Kartajaya e Iwan Setiawan, e que tem como principal objetivo ganhar o apoio e a confiança do cliente, combinando a interação online e o marketing digital, com a interação offline e o marketing tradicional. As marcas estão integrando o melhor dos dois mundos: a imediatez dos canais digitais, com a força de diferenciação que representam as ações tradicionais. Através dessa estratégia denominada omnical (“omnichannel” na terminologia em inglês), se espera alcançar uma experiência transparente e coerente.
Para além de ultrapassar expectativas. Desenho de serviços e experiências Wow!
No que diz respeito ao desenho de experiências de serviço, quando o serviço percebido pelo cliente ultrapassa significativamente o serviço esperado, estamos falando do efeito Wow!
Segundo Kotler, o Marketing 4.0 está associado com o fenômeno WOW, definido como aquele que expressa com maior precisão um impacto emocional não esperando, algo que supera as expectativas do consumidor.
Este consumidor, quando tem suas expectativas ultrapassadas, precisa ser conhecido e entendido a fundo, uma vez que os clientes não são iguais entre si e, consequentemente, nem todos alcançam o efeito WOW sob as mesmas circunstâncias e na mesma intensidade.
“Servitize-se” hoje mesmo! Desenhe sua estratégia CX de forma acessível.
Você não precisa investir nas plataformas mais caras para gerir sua estratégia de experiência do cliente. Com foco, algumas estratégias e ferramentas básicas, você pode começar a explorar as possibilidades de desenho da sua estratégia CX. Abaixo, elencamos algumas recomendações:
- Comece considerando algumas fases e perguntas fundamentais ao pensar na sua estratégia, como:
- Qual a experiência que vivem os meus clientes quando interagem com meus pontos de contato (diagnóstico)?
- O que eu preciso e como posso melhorar a experiência dos meus clientes durante todo o ciclo de relacionamento (definição da estratégia)?
- Como implementar a estratégia considerando as pessoas, a tecnologia e os processos necessários (execução da estratégia)?
- O que eu tenho que avaliar para medir se estou tendo resultados ou se preciso melhorar (medir e melhorar)?
- Você tem dados? Extraia ouro! – Um dos pilares definitivos de uma estratégia “Customer Experience” é o trabalho com dados.
Existe uma vastidão de plataformas acessíveis para obtenção, análise e visualização de dados que você pode considerar, muitas delas gratuitas inclusive. Desde o tradicional Excel, passando pelo Google Forms; Survey Monkey; Tableau Public; MS-Power BI etc. Todos eles te facilitarão obter e analisar essa matéria-prima tão importante.
- Atenda ao cliente interno: A comunicação e seus processos é um músculo que deve ser exercitado constantemente, o qual não é uma exceção ao executar a sua estratégia de experiência do cliente. Incentive uma comunicação aberta e clara entre os colaboradores, fomente o desenvolvimento de habilidades comportamentais, promova a troca e a empatia inter-geracional para enriquecer sua cultura organizacional.
- Não se inspire apenas nas estratégias dos gigantes: Você deseja apontar para o céu e replicar os pilares de otimização contínua, cultura de inovação, agilidade corporativa e “customer centricity” da Amazon? Ótimo! Ainda assim, te convido a explorar e se surpreender com o trabalho de outros players não tão midiáticos. Estude também companhias dedicadas ao foco no cliente como Wegmans, Citizens, Cisco, Sephora, etc.
- Desenvolva a sua filosofia de serviços: A necessidade de criar uma cultura de serviço deve ser fundamentada em uma verdadeira filosofia que impacte toda a organização. Procure as melhores estratégias de recurso humano, técnico e tecnológico, que possibilitem uma relação e integração adequadas e crescentes entre pessoas, empresas e comunidades. Neste sentido, é inevitável apontar empresas com filosofias de serviço que tenham deixado sua marca tais como The Ritz Carlton; Disney; Amazon; Toyota; Alphabet (Google); Starbucks e Zappos. Atender a essa importante dimensão no seu negócio, te abrirá caminhos para fomentar a qualidade de seus serviços, assim como cumprir de forma prática as expectativas de seus clientes, garantido a sua lealdade.
Texto de Edgar Ramírez, Analista de CX da Argo Solutions.